sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Na Cantina da Estrela são os clientes que decidem quanto pagam... no Hotel da Estrela, com alunos da Escola de Hotelaria de Lisboa,..

in iOnline, por Clara Silva, 07 de Janeiro de 2011

Abriu o mês passado no Hotel da Estrela, em Lisboa, e são os alunos da escola de hotelaria ao lado quem cozinha e serve às mesas.


Não se deixe enganar pelo nome do restaurante. Apesar de se chamar Cantina da Estrela e de estar decorado com quadros de ardósia e mesas antigas de madeira, a comida nada tem a ver com aquela que é servida em tabuleiros de plástico na maior parte das cantinas de escola. Basta observar a ementa, encaixada num dossiê com vários separadores, como se fosse um caderno de sumários, para perceber que os pratos aqui são outros: "risotto de balsâmico com foie gras", "bacalhau com todos em cocotte", "peixe do dia em bouillabaise cá das nossas" e outros que tais enfeitados com expressões francesas, italianas e, claro, portuguesas, como "borreguinho que se desfaz na boca".

"A maior parte dos pratos são servidos em tachos e escolhemos o nome ''Cantina'' por ser uma comida aconchegadora, como a que se come em casa", explica Luís Casinhas, chefe de cozinha do restaurante que abriu portas no início de Dezembro no Hotel da Estrela, em Lisboa. Luís tem dupla responsabilidade: além de ser chefe de cozinha, tem de controlar a equipa de alunos que ali trabalha todos os dias, vinda da Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa, mesmo ao lado do restaurante. "Todos os profissionais do hotel são alunos da escola, tanto na cozinha como nos quartos ou na recepção", diz o chefe. "É um hotel de aplicação e como a escola tem quase 400 alunos temos uma equipa diferente todos os dias."

A ementa é fixa, mas o facto de a brigada de cozinha ser rotativa pode dar algumas dores de cabeça a Luís: "A parte cansativa é ter de explicar as mesmas coisas várias vezes... de manhã estão uns, à tarde estão outros... E depois responder sempre às mesmas perguntas: ''Onde é que é a torneira?'' Onde é que está o recipiente?''"


NA COZINHA

Gonçalo Henriques, de 31 anos, está pela primeira vez a cumprir as horas de estágio do seu curso de Gestão e Produção de Cozinha na Cantina da Estrela. "Hoje já tratei da parte da mise en place [a etapa inicial da preparação de um prato em que se medem, descascam e cortam os ingredientes], estive a arranjar polvo e a deixá-lo em vácuo e a preparar bacalhau", conta o aluno, que antes de querer ser chefe de cozinha trabalhava numa mediadora de seguros. "A parte pior é quando começam a chegar muitos clientes, trabalhamos com mais velocidade e entra-se no tal ''lodo'', uma expressão que se usa nesta área para quando há muito serviço."

À noite, Gonçalo trabalha noutro restaurante e por isso já tem experiência nos tachos, mas há alunos que aparecem sem saberem cozinhar. "Embora as aulas tenham uma componente prática, é no restaurante que se aprendem as técnicas e se ganha o brio de ser cozinheiro", diz o chefe Luís que em Dezembro recebeu mais de 70 estagiários. "Até alunos de outras escolas nos pedem para trabalhar aqui."

AVALIAÇÃO

O restaurante fica num dos edifícios onde em tempos funcionou a Escola Secundária Machado de Castro e não se quis esquecer disso. "Para a decoração fomos ao Parque Escolar [empresa pública para a modernização de escolas secundárias] buscar mesas, cadeiras e quadros de escolas que foram demolidas", conta Elisabete Guilherme, responsável de sala do restaurante. E sem esquecer o espírito de avaliação das escolas, os pratos escolhidos pelos clientes também estão à prova. "Existe um preço mínimo e um preço máximo e os clientes pagam o que quiserem consoante gostem dos pratos ou não", diz o chefe Luís Casinhas. "Por exemplo se gostarem muito da nossa sopa de peixe com brunesa de legumes podem dar a nota máxima e pagar 5 euros. Se acharem que precisa de mais picante podem pagar 3 euros, ou dar a nota mínima [2,5 euros]. É uma boa maneira de avaliarmos e aperfeiçoarmos os pratos."

Elisabete garante que, durante o primeiro mês, os clientes "foram justos e não deram a nota mínima só para pagarem menos". "Aliás até costumam deixar [na conta que é a mesma folha da ementa] observações para os alunos".

COPOS PARTIDOS

Não é a primeira vez que Mariana Ferraria, de 19 anos, e Kevin Pereira, de 20 anos, servem às mesas na Cantina da Estrela. "Já fiz serviço mais vezes e estive aqui nas férias", conta Mariana que desde Setembro está no curso de Gestão Hoteleira, Restaurante e Bar. "Faz parte da componente prática do curso e debitam-nos nas horas de estágio." Entre as disciplinas do curso estão várias técnicas como a de Serviço de Cozinha Quente e Serviço de Cozinha Fria. Mas as coisas nem sempre correm bem. "Eu já tive dificuldade em abrir uma garrafa de vinho que é uma coisa que aprendemos nas aulas", confessa Kevin. Mariana teve mais azar: "Quando ia pôr a imperial na mesa, o copo escorregou para cima de uma cliente e partiu-se na cadeira. Mas ela compreendeu, sabe que somos alunos."


Cantina da Estrela, Rua Saraiva de Carvalho, 35, Lisboa. De segunda a sábado das 12h30 às 15h30 e das 19h30 às 22h30. Preço Médio: 25 euros; Tel: 21 190 01 00