quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Português descobre mecanismo responsável pelo fim da regeneração celular

Um investigador português identificou o processo molecular que termina a actividade das células. Este mecanismo associado ao envelhecimento, não sendo o elixir da juventude, pode permitir reduzir danos de doenças cardiovasculares, diabetes ou cancro.

in Ciência Hoje, 2010-02-17

João Passos, investigador do Instituto para a Saúde e Envelhecimento (Institute for Ageing and Health) da Universidade de Newcastle, explicou à Lusa que o mecanismo agora identificado justifica porque pára a divisão celular, um processo normal no organismo que cessa a partir de determinado momento, impedindo a regeneração dos tecidos associada ao envelhecimento. O facto de as células pararem a sua actividade estava identificado há 60 anos, mas desconhecia-se qual o processo molecular que desencadeava esta inactividade.

O também primeiro autor do trabalho de investigação publicado ontem na revista Molecular Systems Biology, detalhou que "cada vez que uma célula se divide existem pequenos fragmentos no núcleo, os telómeros, que são pequenas sequências de DNA localizados final dos cromossomas [das células] que vão encurtando".

Este encurtamento dos telómeros desencadeia um percurso molecular para as mitocôndrias - estrutura no citoplasma da célula que produz a energia necessária para esta viver -, que a leva a produzir espécies reactivas de oxigénio que param a divisão celular.

"Este é o mecanismo que explica porque as células não conseguem proliferar continuamente" e ficam senescentes, explicou João Passos, salientando que este estado, a senescência, acaba por ter dois efeitos paradoxais.

Ao parar a divisão celular, impede-se também a proliferação de células danificadas, o que pode impedir o aparecimento de cancro mas, assinalou o investigador, a contínua produção de espécies de oxigénio reactivas, ou radicais livres, pela mitocôndria celular, e que mantém a célula em senescência, acabam por danificar os tecidos à sua volta e desencadear doenças associadas ao envelhecimento, como a diabetes ou problemas cardiovasculares.

Intervir na senescência é “um desafio para o futuro”

João Passos, que integrou uma equipa multidisciplinar nesta investigação, salienta que ainda se está "muito longe" de conseguir intervir na senescência, de forma a atenuar os efeitos da produção de radicais livres e, simultaneamente, travar a proliferação de células cancerosas mas este é, definitivamente, um "desafio para o futuro".

"É um processo extremamente complicado, os mecanismos moleculares envolvidos no processo são muito complexos e ainda estamos no início. Identificámos um mecanismo, existem muitos outros mecanismos que temos ainda de descobrir", resume o investigador, que alerta para a necessidade de um olhar menos fantasioso em torno da investigação sobre o envelhecimento.

"Não estamos interessados em descobrir o elixir da vida eterna. A população está a envelhecer e o tempo máximo de vida tem aumentado continuamente nos últimos anos. A maior parte da população vai ter mais de 65 anos. O que temos de compreender é a base do envelhecimento para que a vida das pessoas que estão a viver mais tempo melhore, é esse o nosso objectivo", concluiu.